Nota da Pgina
Oriente - Traduzido em nossa redao: IRM
MARIA DE JESUS DE GREDA (1602-1665) greda um vilarejo pertencente provncia de Sria, que confina com Arago e se encontra da mesma forma muito prxima ao limite de Navarra. Se encontra, portanto, situada nos confins de trs reinos histricos da Espanha, nos assentamentos de Moncayo. At os ltimos reajustes de dioceses pertenceu de Tarazona que, atualmente, conta 5.000. Na Idade Mdia conviveram dentro da vila membros das trs religies monotestas. Ainda encontram-se em greda o que foi bairro muulmano-judeu, bem como o edifcio que serviu de sinagoga. A Venervel Irm Maria de Jesus, chamada muito comumente a Madre greda, clebre no mundo conhecida com o nome de greda. Aqui, com efeito, viveu e morreu, sem jamais ter sado dos limites da vila. INFNCIA E
JUVENTUDE Os pais de Irm Maria foram Francisco Coronel e Catarina de Arana. Esta, nascida tambm em greda, era oriunda de Vizcaya, como recorda a prpria Venervel. Efetivamente, no convento de greda se conserva todavia o documento de fidalguia dos Arana, de 1540. O matrimnio de Francisco-Catarina teve onze filhos, porm, sete morreram em idade recente. S sobreviveram dois filhos e duas filhas. Eis aqui os nomes dos quatro: Francisco, Jos, Maria e Jernima. Sobre seus pais, o modo de ser deles, os costumes, etc., a mesma Venervel deixou um esboo biogrfico. Da me, diz que era naturalmente mais oficiosa e ativa que o pai. Ambos extremanente religiosos. A famlia Coronel-Arana se relacionava muito com os franciscanos de So Julio; assim se chamava o antigo convento franciscano que estava situado nos arredores da vila. A me tinha ali seu confessor e procurava diariamente ouvir a Missa na Igreja do convento. Quase no passava dia sem que os frades franciscanos visitassem a famlia. A Venervel confessa que ela, em sua primeira infncia, parecia um tanto preguiosa e intil e para lhe despertar, sua me lhe tratava com dureza. Verdadeiramente posso dizer que em minha vida lhes vi (os pais) o rosto sereno, at depois de religiosa. A explicao que Irm Maria nos d deste comportamento seu na primeira infncia, vai muito alm da que os bons pais podiam alcanar. Nos diz, com efeito, que na idade em no pde precisar, porm, provavelmente coincidindo com o despontar do uso da razo, e sem que recebesse informaes ou ensinamentos exteriores, recebeu de Deus informaes sobre o mundo, estado pecador do homem, etc, cujos efeitos iriam perdurar por toda a vida. Como resultado daquela manifestao concebeu um temor que jamais lhe abandonou: temor de ofender a Deus e perder a graa. Ao cessarem as revelaes, passiva, caiu como suspensa. Via-se rodeada de perigos, repleta de misrias, no ousava falar com as criaturas, a todas reputava superiores. O conhecimento prprio lhe aterrava, costumava ir a lugares ocultos. Por tudo isso, os pais lhe julgavam insensata e intil, e lhe davam o spero trato mencionado. Que iremos fazer desta criatura, que no h de ser para o mundo nem para a religio?. A tudo isso se agregaram diversas enfermidades, que aos treze anos de idade a puseram s portas da morte: Se fez o preparo para meu enterro, disse ela. Porm, todos os padecimentos os suportava completamente, pela convico que tinha de ser filha de uma raa pecadora, obrigada a satisfazer a Deus por seus pecados. Maravilhavam-se os mdicos de que pudesse levar males to cruis, com foras to debilitadas e sem queixar-se. Quando completou os doze anos de idade empenhou-se em tratar de ingressar na vida religiosa. A primeira idia, foi a de tomar o hbito das Carmelitas Descalas de Tarazona e seus pais j faziam os preparativos para que isto se consumasse, quando sobreveio uma circunstncia totalmente imprevista, que havia de mudar o rumo de sua vida. A me da Venervel, Catarina de Arana, teve revelao, confirmada por seu confessor, Fr. Juan de Torrecilla, segundo a qual devia transformar a casa em convento e ingressar nele como religiosas a prpria me com suas duas filhas, enquanto o pai e ingressaria com os dois filhos na Ordem de So Francisco. Na realidade os dois filhos vares eram j religiosos na dita Ordem. Diante disso, Maria deu sua conformidade ao novo plano e desistiu de ir a Tarazona. Porm, a idia era to dissonante, que chocou-se com a resistncia do pai de famlia e tambm com a de um irmo deste, Medel. A oposio dos circunvizinhos, a princpio, foi tambm geral. Diziam que era agravo do santo matrimnio. Assim, transcorreram trs anos. No obstante, pouco a pouco se venceram as oposies e dificuldades; o pai mudou de parecer e, em 1618, feitas algumas reformas prvias, a casa de Frederico Coronel se transformou em um convento de monjas. Francisco, a quem seguiu depois seu irmo Medel, ingressou como franciscano na qualidade de irmo leigo no convento de Nalda (Sria). O tempo que transcorreu at que o projeto se transformou em realidade, Irm Maria o considerou como uma fase de desregramento. Os acaloramentos em torno ao projeto, as obras, etc, a distraram e dissiparam sobremaneira sua vida espiritual e at cedeu tentao da vaidade. O novo convento havia de ser a Ordem da Imaculada Conceio. Sem dvida, o fervor imaculista, que a Espanha conhecia ento um de seus melhores momentos, foi causa desta preferncia. Porm entre as Concepcionistas havia dois ramos: uma de caladas e outra de descalas. Me e filhas se decidiram pelo instituto de descalas. Mas como na rea da provncia franciscana de Burgos, que pertencia a fundao de greda, no havia Concepcionistas descalas, seno s caladas, se cometeu a anomalia de trazer de Burgos trs monjas Concepcionistas das caladas na qualidade de fundadoras de um convento que havia de ser o ramo descalo. Por esta razo dir Irm Maria que a fundao no teve bom princpio, pois as fundadoras vindas de Burgos tinham que ensinar um modo de vida que elas no haviam professado nem praticado. Dezesseis anos tinha Irm Maria quando tomou o hbito, juntamente com sua me e irm. Prontamente houve novas vocaes. Nesta primeira poca, a abadessa, era das vindas de Burgos na qualidade de fundadoras. Uma vez vestido o hbito, Irm Maria reage contra a dissipao anterior e se entrega totalmente vida espiritual. Feita a profisso em 1620, comea em sua vida um perodo de enfermidades, tentaes e extraordinrios trabalhos, que ser seguido por outro de fenmenos espirituais ressonantes. AS EXTERIORIDADES Quando Irm Maria tinha dezoito anos, ou seja, no ano seguinte sua profisso, comeam a ocorrer em sua vida certos fenmenos msticos ressonantes, aos que se deram indiscreta publicidade, sem ela querer ou saber. Um dos confessores que teve por este tempo foi o referido Fr. Juan de Torrecilla. Dele diz a venervel que era mais bom que cauteloso. Irm Maria padecia com freqncia xtases, arroubos e raptos, fenmenos de levitao, gravidade, etc e acudia muita gente a v-la neste estado. As monjas que ento governavam a comunidade vindas de Burgos-, longes de impedir, fomentavam a exibio. E chegou minha infelicidade escreve Irm Maria a que depois de comungar me colocaram o vu e me viram alguns seculares. E como isto, de arroubous, faz no mundo imprudente tanto barulho, estendeu-se e passou adiante a publicidade; as superioras que haviam, eram amicssimas destas exterioridades e foram se empenhando com uns e outros seculares; por haver concedido a alguns, no se lhes negavam a outros. Deu-me aviso disto um enfermo, aflito, que veio ao convento me ver, o que para mim foi to fatigante, minha amargura e dor foram tais, que fiz voto de no receber a Nosso Senhor sem fechar-me na comungatria. Pedi um cadeado e me fechei; e o podia fazer porque s comungava pelas muitas enfermidades que eu tinha. Outras vezes, que me tiravam a chave, bebia xarope ou medicamentos para que no me obrigassem a receber Nosso Senhor, julgando melhor carecer deste consolo, que submeter-me a to grande imprudncia, como mostrar-me a todos os que concorriam que, s de ouvir o barulho deles, me desmaiava; repreendiam-me asperamente e me imputavam desobedincia e, para obedecer, me rendia". Ela mesma, muitos anos mais tarde, quando contava com mais experincia e conhecimento dos caminhos do Senhor, se referir com certas reservas aos sucessos daqueles anos. Ante as queixas da interessada, interveio o Provincial Fr. Juan de Villalacre para pr fim quelas exibies. Por ordem do dito provincial ela mesma pediu a Deus que terminassem todas as exterioridades, tendo Deus a atendido. Isto ocorreu em 1623. O modo que teve de encerrar esta publicidade diz a Venervel foi que, armada de f e esperana, fui ao Senhor e prostrada ante seu Ser imutvel, lhe disse que no me havia de levantar at que me concedesse retirar todas as exterioridades em pblico e que os benefcios que me havia de fazer fossem a ss; e ao prelado, que era el Padre Fr. Juan de Villalacre, Provincial, lhe supliquei que pusesse censuras s religiosas para que, estando recolhida, no me manifestassem aos seculares. O prelado o fez lindamente e o Altssimo desde aquela hora me mudou o caminho e me ps em outro, do qual era mister escrever muito para declarar-lhe. Dilatou-me muito na capacidade de entender as potncias e sentidos para que, com a grande admirao do muito conhecimento, no perdesse os sentidos, e mais conhecia neste estado em um instante que em todos os sucessos dos trs anos. A partir desta data, a vida mstica da Venervel, ainda que mais elevada, ser oculta, sem estas repercusses exteriores. A novidade do cessar daqueles fenmenos produziu no pequena impresso nas monjas e deu lugar a vrios pareceres. Para muitas, o trmino de agora fazia suspeito todos os anteriores. Ela calava. S sua me natural lhe falou algumas vezes, porque a via constristada por este motivo.
A estes anos das exterioridades, pertencem
tambm as supostas viagens
da Venervel para evangelizar aos ndios do Novo Mxico. Quando muitos
anos mais tarde Irm Maria foi submetida a interrogatrio pelos
qualificadores da inquisio, a maioria das
perguntas giraram em torno a essas
supostas viagens da monja Amrica, afirmados No mesmo ano de 1623 voltaram a Burgos as primitivas fundadoras e em seu lugar, se trouxeram de Madri, do convento do Caballero de Gracia, outras trs monjas, tambm na qualidade de fundadoras. Estas sim eram das Concepcionistas descalas. Estas segundas fundadoras governaram o convento por quatro anos. Em 1627 pareceu aos superiores religiosos que convinha nomear abadessa a Venervel, e assim no o fizeram, pois que no havia completado os vinte e cinco anos. Irm Maria guardou sempre muito boa recordao das monjas de Cabellero de Gracia por seu trabalho como educadoras da nova fundao. Se conservam cartas da Venervel s ditas religiosas. Nelas se revelam facetas altamente simpticas de sua personalidade: naturalidade, simplicidade, carter humano e afetuoso, etc. ABADESA
Durante onze anos, ou seja, at que se
cumprissem os vinte e cinco anos desde a fundao do convento, foi Irm
Maria abadessa por nomeao dos superiores religiosos. Depois que se
concedeu direito de eleio Comunidde, foi eleita trinio aps trinio,
at sua morte. S uma vez
conseguiu a interessada, recorrendo ao Nncio Rospillosi, que no se
desse a concesso para reeleg-la novamente, e assim esteve um trinio,
de O governo da Venervel foi mesclado de prudncia, suavidade e eficcia e demasiada brandura. Esteve trinta e cinco anos frente da Comunidade. Tambm no temporal se conheceu a eficcia de seu governo. No primeiro ano de seu cargo decidiu edificar novo convento, fora dos muros da vila e prximo ao convento dos franciscanos. Comeou com to poucos meios, que s dispunha de cem reais, que lhe prestou um devoto. A construo demorou sete anos, resultando em formosa igreja e todas as oficinas necessrias. A mudana das monjas ao novo convento se verificou em 1633 e celebrou-se com grande pompa. Quando no interrogatrio inquisitorial se insinuou Venervel que havia violado o voto de clausura com suas viagens s ndias, esta respondeu com graa que no havia sado da clausura mais que uma s vez e, esta em procisso, ao trasladar-se do convento velho ao novo. Quando Irm Maria entrou para governar, no chegavam as rendas a sustentar doze religiosas. Na sua morte, deixou renda fixa para sustentar a trinta e trs. Em 1652 o convento concepcionista de greda se converte por sua vez em convento fundador. A Venervel cede quatro das suas religiosas para uma nova fundao em Borja (Zaragoza). Existem cartas da venervel nova Comunidade, que foram publicadas recentemente. OS DIRETORES ESPIRITUAIS Dada a parte importante que os confessores e diretores espirituais julgaram na vida espiritual da Venervel, parece obrigatria a deteno neste ponto. Irm Maria foi uma alma possuda durante toda sua vida de um excessivo temor. Temor de errar, de extraviar-se. Por isso se submeteu firmemente obedincia, direo dos representantes de Deus. Jamais dir ela me aquietei sem este rumo. Ao diretor manifestava toda sua conscincia, as graas e favores do Senhor e nada fazia sem sua aprovao e conselho. No mosteiro de greda se conservam todavia inditas as Sabatinas, ou seja, as contas de conscincia que cada sbado dava por escrito ao diretor. Tinha muito impressa na alma a frase do Senhor no Evangelho: Quem a vs ouve, a mim ouve; quem a vs obedece, a mim obedece. Vale dizer que todos seus diretores e confessores, assim como seus superiores eclesisticos, foram da Ordem Franciscana, pois as religiosas estavam sujeitas jurisdio dos superiores religiosos da Ordem a que pertenciam ou que estavam adscritas; e a Ordem da concepo, desde o incio, se ps sob a Ordem de so Francisco. Durante o noviciado teve um confessor que a todos os seus pedidos de permisso para fazer penitncias contestava com um no. Irm Maria ponderava depois o bem que a fez. Durante o perodo das exterioridades teve vrios confessores, cujos nomes conhecemos por suas respostas ao interrogatrio inquisitorial. So eles: o j citado Frei Juan de Torrecilla, Frei Juan Bautista de Santa Mara e Frei Toms Gonzalo.
Com a interveno do Provincial Frei Juan
de Villalacre para pr em ordem as
coisas da Venervel, comea um longo perodo de vinte e
quatro anos em que dirigida pelo Padre Francisco Andrs de la
Torre. Este Padre a dirigiu,
pois, desde 1623 at 1647,
ano em que morreu. Durante seu mandato, Irm Maria escreveu pela primeira
vez a Mstica Ciudad; na
ausncia eventual deste, a
queimou por indicao de outro
confessor acidental, voltando
a refaz-la parcialmente, morte dele a voltou a queimar, etc.
Samaniego nos informa que o rei Felipe IV quis nomear Bispo a este
Padre, porm, renunciou idia por atender melhor a direo da venervel.
Em cartas de Irm Maria ao rei h constncia de ordens que lhe dava este Padre com respeito a consultar ao cu sobre certos assuntos, ou consignar notcias com reflexos sobrenaturais. Tambm a Mstica Ciudad, como sabido, h constantes consultas que fazia a Deus ou Virgem por ordem do confessor. Depois da morte deste diretor esteve por algum tempo s, ou seja, sem diretor. neste tempo que se queixa ao rei de que a Ordem Franciscana no guarda segredo de suas coisas como deveria. Foi tambm agora, neste interregno de diretor, quando foi submetida ao interrogatrio inquisitorial. Na carta ao rei, alude ao fato e faz referncia aos sucessos de sua juventude sobre os quais versou, principalmente no dito interrogatrio: Em meu negcio no h novidade maior que a que escrevi a V. M.; quando me veio aquela visita me achei to s e sem conselho, que me pareceu foroso recorrer ao amparo do Prelado, que o Padre Manero. O Senhor me enviou este trabalho quando no h confessor nem religioso nenhum que conhea meu interior, por terem morrido os que se lhe havia comunicado. Por conta do Altssimo e da Rainha do Cu confio minha defesa; se querem que padea, gozosssima abraarei a cruz. Pelo que a V. M. amo e estimo, lhe quero declarar que, s pela bondade de Deus, tenho livre a conscincia e vontade nas matrias espirituais, ainda que, no sem temor de ter errado, como mulher ignorante e por ter comeado o caminho da virtude, assinalando-se a misericrdia de Deus comigo, sendo ainda menina. Por fim, no mesmo ano de 1650 passa a lhe dirigir o Padre Andrs de Fuenmayor, que a guiou at a hora da morte. Deste, diz ela estar contente, porque guarda segredo: Meu confessor partiu j para sua jornada; mui douto e tem duas vezes o ofcio de Provincial, e o que me consola que guarda em grande segredo as minhas coisas. Sob a direo deste Padre se encontrava Irm Maria quando, por ordem sua, escreveu a redao definitiva da Mstica Ciudad. (Cidade Mstica). O Padre Fuenmayor viveu muitos anos em sua direo, escreveu a vida dela e deposies testificais, que existem manuscritas. CORRESPONDNCIA
EPISTOLAR COM O REI No h dvida que um dos episdios mais admirveis da vida de Irm Maria o de suas relaes com o rei Felipe IV, com quem manteve correspondncia epistolar por espao de mais de vinte anos (1643-1665). Desde ento, as relaes de Irm Maria com o rei da Espanha no so mais que um captulo dentre os mais importantes; no conjunto das mltiplas relaes e da variadssima e dilatada troca de cartas, sustentou a Venervel com mltiplos personagens de seu tempo. Irm Maria escreveu cartas a Papas, reis, generais de Ordens religiosas, bispos, nobres e a toda classe de pessoas da Igreja e da sociedade. Ainda dando por desconto que muitas destas corresnpondncias se tenham perdido, no pode-se deixar de admirar ao considerar o volume, a extenso, a qualidade e variedade de sua atividade epistolar e literria. Bem pde falar Sandoval de Um mundo em uma cela. Porm, voltemos ao tema de sua correspondncia com Felipe IV. Em julho de 1643 Felipe IV se detm em greda, a caminho de Zaragoza. Visita a Irm Maria e lhe prope sua idia de manter correspondncia com ela. O rei lhe escrever a meia margem, a fim de que a contestao da monja v no mesmo papel. E, segundo o acordado, dentro de poucos dias lhe escrevia o rei j de Zaragoza sua primeira carta. Assim se iniciou esta clebre correspondncia, que no interromperia seno com a morte da Venervel. A edio de Silvela consta de 614 cartas, das quais 314 so da monja, e o resto do rei. Que buscava Felipe IV quando bateu s portas daquele mosteiro? Ajuda sobrenatural, sem dvida, pois que os meios humanos e naturais lhe iam faltando momentaneamente. O panorama da monarquia espanhola era inquietante: Catalunha sublevada, guerras e reveses com Frana, Flandres, Itlia, Portugal; falta de meios e recursos para atender a tantos empenhos... O rei acabava de apartar de si ao onipotente conde duque de Olivares, a quem a opinio popular culpava de todos os desastres. Porm, s e sem o conde, o aptico Felipe IV, que podia fazer? A conscincia lhe dizia tambm que com sua vida desregrada, tinha a Deus ofendido. Em tamanho aperto pede, pois, socorro a uma alma santa, confiando que com suas oraes, valimento ante Deus, luzes e conselhos, lhe ajudar a sair daquele labirinto. Irm Maria no defraudou as esperanas que o rei depositara nela. Com fidelidade e perseverana exemplar foi contestando as cartas reais e desempenhando por este meio um verdadeiro trabalho de reeducao crist do monarca; ao mesmo tempo, no deixa de dar-lhe conselhos atinados em questes de ordem poltico-militar que o monarca lhe expe. Assim, por exemplo, em um momento em que o rei se sentia tentado a fazer caso omisso dos foros de Arago, Irm Maria lhe adverte que no o faa por nada do mundo. Quando o rei quis fazer extensiva a Arago a jurisdio da Inquisio, Irm Maria lhe aconselhou adiar este assunto, por ser inoportuno naquele momento; o essencial ento era conseguir a cooperao aragonesa, para o qual havia que afastar os pontos conflitantes. Depois de reconquistada Barcelona, a monja lhe aconselha que ponha ali ministros que concordem bem com os reais, etc. Silvela chegou a dizer que a monja de greda, com sua clarividncia e instinto, salvou a unidade da Espanha naquela hora verdadeiramente crtica e decisiva. Na ordem internacional, encorajou o rei a fazer as pazes com a Frana. E, efetivamente, teve o consolo de ver logrado este objetivo ao firmar-se a Paz dos Pirineus. Irm Maria tem uma preocupao constante e geral por aconselhar a paz. No consegue conceber que, para possuir-se um lugar, morram tantos homens redimidos por Cristo: Por defender coisas terrenas, praas ou reinos (pouco importando o que tenham uns ou outros) se derrama tanto sangue cristo, morrem milhares e milhares de homens, gastam os reis suas fazendas, tenham aos pobres sditos oprimidos, cheios de tributos .... A preocupao pelos pobres, ao transmitir ao rei as queixas, vexaes e trabalhos destes, outra constante que se adverte nas cartas. Inclusive, chega a dizer que o estado eclesistico muito pouco sente a necessidade da paz, porque a ele no lhe alcanam as conseqncias da guerra, que tanto afligem aos pobres. Segundo parece, mais de uma vez sentiu-se Irm Maria desencorajada e tentada em suspender aquelas cartas, sobretudo vendo a pouca emenda do rei (coisa que a ela no se lhe ocultava, pois estava a par das coisas da Corte); porm lhe sustentou um fogo de ardoroso amor, que ela acreditava infuso, e que lhe impelia a trabalhar por aquela monarquia, cuja causa vinha identificada com a de Deus e a Sua Igreja. O rei, por sua parte, quase constantemente repete em suas cartas o alvio que recebe com a correspondncia de Irm Maria, o gozo com que toma o trabalho de escrever-lhe, a dita pelo fato de t-la conhecido, a pena que sente quando a monja tarda em contestar, etc. Sem dvida, o que confortava e comovia ao rei era, sobretudo, ver a ntima compenetrao e o sincero interesse com que aquela alma de Deus se fatigava pelo seu bem e por causa de sua monarquia. Vejamos algumas passagens: Em todas as cartas que me escreveis encontro novos motivos de agradecimento, pois reconheo com clareza o amor que me tens e os desejos to vivos do meu maior bem, tanto espiritual como temporal. Isto me encoraja muito em meio aos cuidados em que me encontro; grande alvio saber que se tem algum que os desejava abrandar e que o procura certamente no caminho seguro, como o da orao. Com muita alegria recebi vossa carta, como me sucede com todas as que me escreveis, e que na verdade no encobrem o amor que me tens, desejando meus acertos, pois tudo o que me referis nelas o declaras suficientemente. Eu estimo e agradeo muito, vontando a pedir que continueis esta boa obra que me fazeis, o qual espero me h de valer muito; e no descuideis de trabalhar nem desanime em consider-los to humilde instrumento, pois Deus quer mais a estes que aos soberbos. Um feito que dilata a finura da alma de Irm Maria o absoluto desinteresse com que serviu ao rei. Queremos dizer que nunca se aproveitou de suas relaes com ele para receber vantagens a seu favor, de seu convento ou de seus familiares. Ao que parece, o irmo maior da Venervel, Francisco, quis valer-se da influncia de sua irm para chegar a ser bispo; inclusive chegou a ter uma audincia com o rei. Irm Maria, que no lhe pode fazer desistir de seus intentos, de antemo, avisa ao rei da visita; dize-lhe que lhe d boas palavras de despedida, mas sem levar a srio suas pretenses. O EXAME DA
INQUISIO Nas pginas anteriores temos aludido vrias vezes ao interrogatrio inquisitorial a que foi submetida a Venervel. A Inquisio espanhola abriu processo pela primeira vez no assunto da Venervel em 1635. Porm, ento parece ter limitado-se a fazer algumas perguntas a diversas testemunhas e informantes, caindo a causa em suspenso durante muitos anos. Porm, em 1649 se retoma o exame. Ao trinitrio Padre Antnio Gonzalo Del Moral se lhe manda ir a greda como qualificador do Santo Ofcio e interrogar a Venervel diante do notrio base de um questionrio de oitenta perguntas, a maioria das quais se referem suas supostas viagens s ndias. Irm Maria, reconhece que naqueles anos das exterioridades, como havia ouvido falar da evengelizao dos ndios, acreditava s vezes ser levada para l, onde lhes pregava; porm, sempre abrigou dvidas sobre a realidade de tais fatos. Por outro lado, Benavides e outros Padres respeitveis deram o fato por incontestvel e lhe fizeram firmar o famoso Memorial. Lhe amedrontaram dizendo-lhe que podia cair na heresia de Pelgio, atribuindo natureza o que era sobrenatural. Me rendi disse ela mais obedincia que razo. Nas respostas da Venervel vemos o juzo que muitos anos depois tinha ela formado sobre o perodo das exterioridades. Ao dizer ela aos confessores os os favores que lhe faziam os anjos, lhe ordenavam por obedincia que perguntasse os nomes dos ditos anjos, e disse alguns, etc. Pelo que do interrogatrio se deduz, todo este fato das viagens s ndias se originou de uma carta do Padre Francisco Andrs de la Torre, diretor da Venervel, ao Arcebispo do Mxico, dom Francisco Mando de Ziga, em que lhe dizia que averiguasse se no Novo Mxico sabiam de uma monja que andava fazendo conversaes. Mais tarde veio dali Frei Alonso de Benavides dizendo que, efetivamente, havia sido vista, fornecendo detalhes. Este redigiu um Memorando que foi amplamente difundido. Ao perguntar o qualificador Irm Maria porque firmara o Memorando de Benavides, esta argumentou ela que quando o firmou estava turbada, afirmando o que no sabia, e pensava que ela estava errava e eles certos: ao ver-se diante de tantos Padres solenes no sups fazer outra coisa. Acrescentou que os frades e monjas dispuseram o caderno como quiseram, e de sua informao temerosa fizeram pouco caso. Diziam que tinha temores imprudentes e escrupulosos. Enfim, acrescentou Irm Maria, que sobre a questo de ida s ndias mais de uma vez, pensou fazer uma declarao verdadeira por escrito, vendo quo variavelmente falavam, e em algumas coisas exageravam a verdade; porm, crendo que o tempo o esqueceria, tomou o cuidado de queimar os papis que havia feito. O qualificador Fr. Antnio Gonzalo del Moral, trinitrio, encerra o expediente fazendo uma declarao sobre o alto conceito que se formou da interrogada, desculpando o assunto de ida s ndias pelas circunstncias em tudo aquilo que se escreveu.
Cabe perguntar o que moveu a
Inquisio a prosseguir agora em uma causa que, durante muitos anos,
havia permanecido praticamente esquecida. Parece que a ocasio foi a seguinte: o duque
de Hjar havia sido processado por conjurao contra o rei, e durante
o processo apresentou, a modo de desencargo, uma carta da Venervel. Tambm
o Padre Montern, franciscano, havia sido posto na priso porque em seus
sermes falava de revelaes
que anunciavam desgraas ao rei. De fato, no interrogatrio, se perguntou Venervel sobre suas relaes com o duque de Hjar e
o Padre Montern. LTIMA
ENFERMIDADE E MORTE A ltima enfermidade, segundo o bigrafo, foi ocasionada por uma febre e abscesso no peito. Foram onze dias no total, os que teve de permanecer na cama. Em todos eles, serviu de edificao geral s religiosas, s que, por insinuao do confessor, e vendo que choravam amargamente, falou nestes termos no momento de receber a extrema-uno: "Irms, no faam isso; olhem que no temos tido outro trabalho e que se devem receber com igualdade de nimo os que Deus envia; se Sua Majestade quer que nos apartemos, cumpra-se sua santssima vontade. O que eu os rogo que sirvam ao Senhor, guardando sua santa lei, que sejam perfeitas na observncia de sua regra e fiis esposas de Sua Majestade, e procedam como filhas da Virgem Santssima, pois sabem o que devemos nossa Me e Prelada. Tenham paz e concrdia entre si e amem-se umas s outras. Guardem seu segredo, afastando-se de criaturas e retirando-se do mundo: deixem-no antes que ele as deixe. Desenganem-se das coisas desta vida e trabalhem enquanto tem tempo; no esperem este ltimo episdio, quando impede o agravamento da enfermidade e prostrao da natureza. Cumpram com suas obrigaes, que com isso terei eu menos purgatrio, de tantos anos de prelada. Se prodecerem assim recebero do Senhor a bno, que eu lhes dou". Ento, levantando a mo e formando sobre elas o sinal da Cruz, disse: "A virtude, a virtude, a virtude lhes encomendo". Em seguida, foram chegando sucessivamente uma aps outra para pedir-lhe em particular sua bno, e a cada uma deu a amorosa Madre as advertncias e conselhos que em particular lhes convinha, cuja eficcia e acerto maravilhoso, no que a si toca, testifica. Foi assistida nos ltimos momentos pelo Provincial Samaniego e pelo prprio Geral da Ordem, P. Salizanes, que indo de caminho a Santo Domingo da Calada para presidir o captulo que tinham de celebrar as provncias de Burgos e Cantabria, se desviou a greda e assim pde estar presente na morte e exquias da Venervel. Morreu esta no dia de Pentecostes, 24 de maio de 1665, hora tera. A suas exquias concorreu numerosa multido, pois era geralmente estimada. A poucos meses, como se a falta de sua fiel e sincera amiga lhe tivesse abatido, morria tambm Felipe IV.
O mosteiro da
Concepo de greda, a trs sculos destes fatos, manteve viva
e operante a recordao da Venervel. Dentro de seus muros
se conservam religiosamente numerosos objetos relacionados com ela.
Dentre eles, os oito livros da Mstica Ciudad,
autgrafos e profuso de outros escritos e documentos. O corpo da
Venervel, depositado em uma preciosa urna, e o da sua me,
Catarina de Arana. A tribuna aonde se retirava. A cela que
habitou, com duas janelas, uma voltada a Moncayo e outra ao Norte. O
hbito franciscano que levava por dentro, alm do da sua Ordem
Concepcionista. Casulas bordadas por ela, etc., etc. Efetivamente, Irm
Maria foi de reconhecida percia e habilidade para trabalhos manuais e
entendia de panos e telas, como o evidencia na Mstica Ciudad
ao falar do vestido que com suas mos fiou e teceu a Virgem para o Menino
Jesus. (MCD, P. II, n. 686). Irm Maria, como tantos outros casos relevantes da espiritualidade crist, a realizao mais completa, daquela parbola evanglica segundo a qual da morte brota a vida; da contemplao, ao; e a prova de que a vida escondida em Cristo a mola mais poderosa do verdadeiro amor ao prximo. Sobre a Mstica Ciudad de Dios diz sua autora em sua parte III, cap. 23, n. 791: Esta divina Histria, como em toda ela fica repetido, deixo escrita por obedincia de meus prelados e confessores que governam minha alma, assegurando-me por este meio ser vontade de Deus que a escrevesse e que obedecesse sua beatssima Me, que por muitos anos me o tem mandado; e ainda que toda posta censura e juzo de meus confessores, sem ter palavra que no tenham visto e confderido comigo, com tudo isso a sujeito de novo a seu melhor sentir e sobretudo a emenda e correo da Santa Igreja catlica romana, a cuja censura e ensinamento, como filha sua, protesto estar sujeita, para crer e ter s aquilo que a mesma santa Igreja nossa Me aprovar e crer e para reprovar o que reprovar, porque nesta obedincia quero viver e morrer. Amm. * * * * * * * * * Fontes: Corpo Incorrupto - Ministrio da Educao e Cincia - Madri/Espanha - https://serbal.pntic.mec.es/~jlacas1/agreda.html Biografia (idioma espanhol) - Site dos Franciscanos - Valena/Espanha - https://franciscanos.org/enciclopedia/mjagreda.htm Traduo e adaptao: www.paginaoriente.com
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